quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Leituras


Minhas leituras são diferentes
Não leio Vinícius, não leio Clarisse
Leio tuas passadas
Leio o desenho dos teus cabelos
O balanço do teu vestido
Leio o que no caminho tu imprimes

Leio até o entre parênteses do teu olhar
Grifo o detalhe das tuas mãos de dedos longos
Faço com cores vivas
Copio na mente pra recordar

Mais tarde sozinho
Transcrevo
E logo percebo
Que daquilo que li
Apenas um esboço ficou
E logo quero ler-te novamente

Literatura perfeita
És prosa, toda prosa
És poema, em lirismo de mulher
Em doçura de moça
És métrica perfeita

Versos apaixonados
Versa no caminho meu
Faço Ode aos carinhos seus
Quem lerá teus escritos
Tateando as linhas
Das tuas páginas vivas

Que seja Homérico
E progressivamente amável
O meu deleite em ti, minha leitura.

Tudo é tão pouco


Tudo é tão pouco
E tampouco tudo é algo
E por tão pouco tudo entrego
E de tudo um pouco sinto falta
Mesmo estando pouco atento
Em momentos que me ausento
Aquele pouco me acalma

Tudo é tão vago
E decerto tudo é triste
E se por mais nada a vida insiste
Entrego os pontos e me calo
E mesmo estando em ponto de partir
Sei que em momentos há de vir
Aquele ponto que me acalma

Tudo é tão pobre
E dos mais pobres sou mendigo
E dos mendigos o mais faminto
E dos famintos o mais fraco
E dos mais fracos o mais sofrido
Peço aquele pouco e mais nada

Tudo é tão falho
Tudo é tão inacabado
Tudo é tão vazio
Em mim
Que chego ao ponto que me acabo
Abro mão do que vivi
E de tudo o que cri
E eis que chego ao ponto
Que de pronto vê-se o fim
Desse pranto amargurado   
Chego ao ponto que confio em Ti

Deus,
Tudo em mim é falho
Tudo em mim é nada

Deus,
Tudo a Ti!   

E Sofre


O poeta nasce e vive para o sofrimento
Na maternidade o primeiro choro é da dor que dá
Por ser quem é
E sofre. 
O choro dele é mais longo e sofrido
Faz também longa e sofrida a noite dos pais,
Pois tem mais drama pra sentir
E compartilhar

Sua vida será de encantamento
De flagelo em sentimento  
De paixão talhada em pedra
Ou amor ficcional

Para o poeta, a noite é aflição
Começa no berço o prantear
Enquanto o mundo - dorme.
Ele - sofre.

Sim, nasce-se poeta
Sua cruz eterna é ser quem é

Ele pode dar voltas
Ignorar seu penar
Mas sempre volta à noite lagrimar

Sofre por amar
Por não amar
Por ser amado
Por não ser amado
Por querer
Por não querer
Por sentir
Por não sentir
E é assim a cruz de quem nasce para o martírio de ser quem é 

Ser poeta

E sofre.

Migalhas


Tem ferida aberta
Na alma
Tem dor aguda
No peito
Tem vida vazia
Vivida
Tem gente pensando
Ter jeito
Tem rosto amassado
No espelho  
Tem ratos brigando
Na sala
Tem corpo andando
Sem vida
Tem gente falando
Nada
Tem pedaços de carta
Na manga
Tem sorte lançada
Ao vento
Tem sono perdido
Há tempos
Tem contos de amor
Se perdendo
Tem migalhas jogadas
De mim

Malfeitor


Ai, coração maldito. Coisa perdida, sem paz.
Passa para trás todo o juízo.
Vai onde quer e nem sabe o que é preciso.
Subsiste usando minhas forças.
Enganador.
Salteador de mim.
Saltígrado malfeitor.
Pérfido executor.
Arrancar-te de mim seria bom.
Haveria bem menos dor. Se vida ainda houvesse.