sábado, 23 de outubro de 2010

O Sal


Cadê o gosto? Cadê o sal? Foi-se o sal das lágrimas. Foi-se ao som das lástimas.
Deu-se ao fio da foice
Cadê o gosto? Cadê o doce? Deu-se ao deleite  Da triste vida de enfeite
Deu-se ao dar-se. Cadê o gosto da novidade?

Abraça-me. Faça-me torpor na prova do venenoso sal da tua pele.
Na prova da tua carne. Nas provas de minha boca.
Quero noites à tua espreita  
Quero dias à tua espera
Quero ao campo das tuas carícias a fartura de uma colheita

De noite te quero alva
De dia te quero negra
De todo te quero sempre
Pra sempre te quero minha.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

À Pátria

De tanto que sinto, pouco tenho a dizer.

E mesmo com todo amor que tenho pela vida eu insista em tentar abrir um tanto, a Pandora caixa que em meu peito se enterra, certamente não conseguirei desvelar o selo deste manto.  Certamente calar será o ato deste peito em constante desencanto.

Parco em zelo, com quase nenhum querer vivaz, encruo a vida lamentando. 
Hasteio a bandeira da terra dos infelizes. Sinto-me, desta terra, um patriota depreciando sua pátria triste, por estar tão triste que da tristeza pátria desdenha ao namorar a fronteira do desprazer da vida, ansiando repatriar-se.  
Pouco tenho a dizer além da tristeza que teimo em viver. De tanto que sinto.       

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

(Érre)


Reviro textos inacabados.
Revivo momentos passados.
Revido golpes, mesmo cansado.
Retiro argueiro de olhos vazados.
Repito trechos de poemas privados.
Reparo sapatos para andar descalço.
Releio frases que interpreto errado.
Relaxo meu andar já muito largado.
Relevo amigos desinformados.
Revelo feridas que inspiram cuidados.
Resvalo em vasos há muito tempo quebrados.

Respire um tanto.

Resta relatar rumas de rimas ruins deste roto que reza ainda ser lido.
O Resto redijo amanhã.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Sossego

Sossego. Te espero como quem espera no leito a cura.
Te espero como quem conta as horas para o reencontro.
Te espero como quem traça planos para o rebento.
Te espero como quem espera  o fim do mês para o soldo.
Te espero como a mãe espera o filho chegar da noite.
Te espero como quem espera a chuva passar pra ir.

Sossego. Sossega-me como no colo o pai acalenta o filho.
Como o silêncio no fim da guerra.
Como o sopro no alívio do ardor.
Como o doce corta o amargo.
Como o sono supera a fome.
Como o sonho bom que ninguém interrompe.

Sossego. Sossega-me como quando as lágrimas derramadas alcançam a alma.
Sossega-me como quando se olha um espelho d’água e vê-se o céu.
Sossega-me como o devoto sossega ao cumprir a promessa.
Sossega-me como a harpa acalmava o espírito em tempos de Velho Testamento.
Sossega-me docemente como é doce assistir o abraço de duas crianças.
Sossega-me como o sorriso dela me faz.

Ou melhor, sossego.
Faça melhor.
Traga o sorriso dela.
E nada mais.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Todas Elas

Veja! Ali! Aquelas!
São de belezas tão modestas.
São de modos acanhados. 
De pequenos risos.
Andam juntas porque sozinhas são mais frágeis.

E aquelas! Bem ao lado do morro.
Se excluem. Se isolam.
E nisso está toda a beleza.
Aquele pedaço é todo delas.

E aqui. Essas, com seus corpos celestiais
Formam linhas que fazem a imaginação delirar.
O céu.

Acolá, aquelas parecem chorar. 
Minguando.
Parecem lamentar não ser Dalva.
Dalva é linda. Toda linda.
Toda entregue. Radiante.
Beleza ofuscante.
Dalva é esplendor. 
Desejada. 
Também a quero.
Como todos querem. 
Quero dormir com ela.

Ao sul, Solene.
A cruz, o Cruzeiro.
Sou como devoto.
E de tanto olhar. E cobiçar. Faço o sinal da cruz.
Deus, que me afaste do pecado.

São tantas. 
Quero todas.
Em minhas mãos. 
Nuas.
Minhas.
Fito os olhos nelas. 
Quero-as todas.
Quero todas e cada uma.
Quero-as para te dar.
Todas elas. 
Do céu. As estrelas.